quinta-feira, 19 de maio de 2016

Considerando os temperamentos na educação dos filhos

Um dos grandes bens que a educação domiciliar proporciona é a individualização do ensino. Cada aluno possui características próprias que fazem com que o aprendizado seja mais eficiente se forem considerados tais atributos no processo de aprendizagem. Há crianças que precisam estar sob vigilância constante, enquanto outras trabalham melhor de forma mais independente. Há alguns que passam horas estudando um único tema, já há outras que precisam mudar de objeto de estudo ou usufruir de frequentes intervalos durante o dia. São inúmeras as características que devemos considerar. Isso parece ser bastante evidente para quem já se aventurou em educar, mas o que não é nem um pouco óbvio é conseguir identificar as características do aluno e a melhor forma de ensiná-lo. Pais atentos que educam os filhos em casa naturalmente vão percebendo essas características com o passar do tempo, ainda que muitas vezes essa percepção seja falha ou muito lenta. Ouvimos relatos de pais que tiveram que tentar diversas formas de ensinar e, somente após várias tentativas, descobriram como o filho aprende melhor. Nosso caso não foi tão diferente. A Juliana demorou um tempo para compreender como o Victor Hugo assimilava melhor o conteúdo. Para isso, tivemos ajuda que todos os pais que educam seus filhos em casa deveriam levar em conta, pois encurta bastante o trabalho: a identificação do temperamento da criança.


Já tínhamos ouvido o Rafael Falcón e a Camila Abadie alertando sobre a importância da identificação do temperamento dos filhos para ensiná-los, mas foi a partir do texto “Os Temperamentos”, indicado pelo Rafael Brodbeck no curso “Como Catequizar seus Filhos em Casa”  que passamos compreender a importância de saber o temperamento tanto dos pais quanto dos filhos para melhor educá-los. Não vamos aqui descrever detalhadamente os temperamentos, mas gostaríamos de mostrar o quanto essa descoberta tem sido importante para nossa família, não só na educação do Victor Hugo, mas no relacionamento familiar e na nossa própria autoeducação.

Os quatro temperamentos foram identificados ainda na Grécia antiga, provavelmente por Hipócrates. Não é uma moda da psicologia moderna, tampouco um conhecimento exotérico. Todos nós temos um dos quatro temperamentos ou um misto deles, mas apenas um exerce sobre nós influência preponderante. São eles: colérico, sanguíneo, melancólico ou fleumático. Cada um desses temperamentos apresenta uma série enorme de características e particularidades que torna fácil de identificá-lo em nós mesmos ou nas pessoas com quem convivemos. Entretanto, todos esses atributos são consequência de como cada um reage a um estímulo, de como cada temperamento responde a uma ofensa, um elogio, um fato triste, uma conquista, uma derrota, etc. Apresentamos abaixo, de forma resumida, alguns aspectos dos quatro temperamentos. Nossa intenção com esse texto não é descrever os pormenores de cada temperamento, muito menos oferecer um curso sobre o tema, mas somente dar um testemunho de como esse conhecimento tem ajudado a nossa família e encorajar as demais famílias a estudar um pouco sobre o tema.


TEMPERAMENTO COLÉRICO

O colérico costuma excitar-se rapidamente e longamente diante de estímulos. Isso significa que ele se interessa muito fácil por algum assunto ou acontecimento e esse interesse permanece por longo tempo. Da mesma forma, ele costuma se irritar, magoar ou se alegrar facilmente e tais sentimentos permanecem por longo tempo na alma do colérico. Quem educa um colérico goza de uma certa facilidade, pois eles são mais independentes. Ao se interessar por um tema, eles vão a fundo em suas pesquisas sem que o tutor tenha que ficar cobrando, explicando ou incentivando. O educador do colérico deve ser aquele que indica ao pupilo o que estudar, deve apresentar desafios, deve excitá-lo e tomar sempre o cuidado para que ele não tome o caminho errado. Devido à rápida excitação e à persistência típicas do colérico, eles tendem aos extremos: ou são empreendedores de grande sucesso ou empresários falidos; ou são grandes santos ou grandes pecadores; etc.  Em nossa casa, a Juliana é a colérica. Saber disso nos ajuda a lidar com seus momentos de irritação e de grande alegria. Hoje eu entendo por que ela fica brava ou irritada com as mínimas coisas e essa compreensão faz com que eu releve muitas coisas que ela diz e me permite ajudá-la a não transformar o temperamento em causa de pecado.


TEMPERAMENTO SANGUÍNEO

O sanguíneo é aquele que se excita rapidamente, mas que logo se arrefece e já concentra suas emoções em outros novos estímulos. Por exemplo, se alguém ofende um sanguíneo, ele fica muito chateado no momento, mas rapidamente esse sentimento some, pois ele já está preocupado com outra coisa. Essa velocidade com que a excitação vai embora gera problemas tanto na educação moral quanto na instrução técnica: as reprimendas não surtem efeito e seu interesse por um tema desaparece de uma hora para a outra. Esse é o caso do Victor Hugo. Como a Juliana é colérica, é normal ouvir as broncas que ela dá no Victor e é decepcionante ver que depois de um minuto ele já esqueceu a repreensão e está pronto a cometer o mesmo erro novamente. Portanto, aprendemos que não adianta ficar bravo com ele, mas que é muito mais eficiente fazermos com que ele sofra as penas de seus erros ao longo do tempo. Para os afazeres diários é necessário ter paciência, repetir todos os dias aquilo que ele deve fazer, até que, depois de muita insistência, torne-se um hábito.

O sanguíneo também é muito facilmente influenciado, para o bem ou para o mal. Já tínhamos percebido essa característica no Victor Hugo e o perigo que ele corria sob influências de más amizades e de professores doutrinadores. Esse foi um dos motivos para decidirmos começar a educação domiciliar imediatamente.

Na instrução técnica, o problema do sanguíneo é que ele muda de interesse a cada momento e assim torna-se muito difícil de aprofundar-se em uma matéria, de refletir a longo sobre um tema. Por isso, nós temos que ser muito insistentes com o Victor Hugo e força-lo a continuar se dedicando a algo que não desperta mais o seu interesse como anteriormente. Notamos que existe uma linha tênue que separa o respeito ao temperamento dos filhos à conivência com o erro provocado pelo temperamento.  Portanto, eu não posso exigir que o Victor Hugo reflita sobre um tema com a mesma profundidade que um melancólico, mas também não posso deixa-lo à mercê dos ventos de seus interesses, sob pena de fazer com que ele nunca seja bom em coisa alguma, nem moralmente e nem tecnicamente falando.


TEMPERAMENTO MELANCÓLICO


O melancólico, que é o meu caso, é difícil de ser excitado, mas quando algo o comove, o estímulo dura por muito tempo. Longas e profundas reflexões são típicas do melancólico, o que pode ajudar muito na vida de fé e estudos, mas que tem o mesmo poder de transformá-lo em uma pessoa cheia de remorsos, pessimista e triste. O melancólico é calado, lento e apático. Não podemos esperar pro-atividade dele. Ainda que normalmente seja possuidor de talentos, é difícil fazer com que ele se mova ou tome alguma iniciativa. Muitos melancólicos poderiam ser grandes profissionais nas mais diversas áreas, mas morrem sem nunca ter tido a iniciativa de dedicar-se ao seu talento. Para educar um filho melancólico, é necessário incentivá-lo a agir, a se envolver com o que será estudado.


TEMPERAMENTO FLEUMÁTICO

O fleumático é aquele que dificilmente será excitado e quando algum estímulo o atinge, logo passa. Como consequência, ele não se interessa muito por estudos ou trabalhos, tampouco se entusiasmam com desafios, mas prefere o descanso, a tranquilidade. O que passa fora deles não os atinge, portanto é difícil que se movam por algo maior do que aquilo que atinja diretamente as suas rotinas. A vantagem do fleumático é que ele se mantém tranquilo perante as adversidades, insultos, fracassos. Educar o fleumático exige muito trabalho e paciência dos pais: é necessário explicar-lhes tudo e por repetidas vezes. Os fleumáticos normalmente se destacam em áreas em que a comunicação é mais importante que o conhecimento profundo sobre algum tema, como no comércio.

Temos que tomar muito cuidado para que, ao identificar os nossos temperamentos ou os de nossos filhos, não caiamos na tentação de utilizá-los como desculpas para nossos erros. Se o temperamento nos faz tender a um pecado ou um mal comportamento, temos que ter consciência dessa tendência e combatê-la com maior rigor ainda, temos que nos violentar por amor à nossa família e por amor a Deus. Se devemos ter esse cuidado conosco mesmos, tanto mais devemos combater as tendências ruins dos temperamentos de nossos filhos. Se nós deixássemos que o Victor Hugo agisse de acordo com as suas tendências temperamentais, nós simplesmente não o estaríamos educando. Portanto, a vantagem de identificar o temperamento dos filhos é saber precisamente qual o ponto que devemos nos ater para que ele se torne um homem virtuoso, ainda que seu temperamento o faça propenso a ser escravo de seus vícios.


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