quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Laicismo na educação: a separação entre o conhecimento e a Verdade


“A fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de O conhecer a Ele, para que, conhecendo-O e amando-O, possa chegar também à verdade plena sobre si próprio.”
São João Paulo II, Fides et Ratio



A educação deve ser desvencilhada da religião? Se a espiritualidade é uma opção pessoal, de caráter íntimo, e se o Estado, que seria o ente responsável pela educação, é laico, como uma escola poderia ter qualquer ligação com uma religião? Poderia uma escola deixar de ensinar algo por respeito à religião da maioria de seus alunos? Este post é uma breve reflexão sobre tais questionamentos. Começaremos com uma brevíssima, porém necessária apresentação histórica do surgimento e desenvolvimento dos institutos educacionais. Após o apanhado histórico, discorreremos sobre a relação real entre educação e fé e sobre o papel dos pais na realização de tal relação. Verificaremos que aquilo que nós podemos enxergar, à primeira vista, como um grande problema, pode ser somente um sintoma de uma doença que tem um tratamento que está à nosso alcance.

1. Os Sintomas:

As escolas, as universidades, a produção científica, as artes plásticas, a literatura, a música, a alta cultura, enfim, tudo aquilo pelo qual nós podemos nos alegrar de ser parte da civilização ocidental, devem sua existência à Igreja Católica. Não que nada disso não existisse antes do advento do cristianismo, pois certamente a Roma e a Grécia antiga foram os grandes berços da cultura ocidental. No entanto, nos séculos VIII e IX, quando os bárbaros tinham destruído a base do conhecimento existente, as escolas catedráticas e os monges beneditinos conseguiram bravamente preservar o conhecimento dos gregos e romanos e iniciar uma série de empreendimentos educacionais. Não é à toa que São Bento é o padroeiro da Europa e é considerado o pai da Civilização Ocidental. Eles não só conseguiram restaurar o conhecimento greco-romano, como levaram a cultura e a civilização aos povos bárbaros. As próprias universidades nasceram no seio da Igreja em plena Idade Média (séculos XII e XIII), como a Universidade de Paris, Oxford, Bologna, Padova, Pisa e tantas outras. Para quem tiver interesse sobre o tema, recomendo como ponto de partida dos estudos, o livro do Prof. Thomas Woods Jr. “Como a Igreja Católica Construiu a Civilização Ocidental”. Há também um programa baseado no mesmo livro e disponível no YouTube, chamado “A Igreja Católica: Construtora da Civilização” (https://www.youtube.com/watch?v=ng8dume3V6k).
Prof. Thomas Woods Jr. desmistifica o papel de
grande vilão da história que é imputado à Igreja por
professores de história que não estudam história. 
Mesmo no período renascentista não havia uma oposição sistemática entre o saber e a religião, houve apenas uma restauração de vários elementos do paganismo greco-romano. Note que nem mesmo o conhecimento desses pensamentos pagãos seria possível se a Igreja não os tivesse preservado. Basta conferir os temas das grandes obras de arte daquele período para constatar que não houve afastamento do cristianismo por parte de grande dos pensadores e artistas.  A situação começou a mudar, de fato, com o domínio intelectual dos iluministas franceses na Europa continental e a consequente Revolução Francesa. Houve um notável domínio de pensadores anticristãos no ocidente durante os séculos XVIII e XIX. Aliás, foram os iluministas que pintaram a caveira do período em que a Igreja predominava como mestra da ciência, da cultura e das artes, criando alcunhas como "Idade das Trevas", "período obscurantista", etc. A própria denominação “Idade Média” foi uma tentativa dos iluministas de menosprezar esses mil anos "insignificantes" que se intrometeram entre a antiguidade e a Idade Moderna. Os iluministas criam ter-se emancipado de Deus e de qualquer superstição. Apesar de parecer contraditório, tais intelectuais que se julgavam livres da crença em Deus não fizeram nada mais que trocar a fé em Jesus Cristo pela idolatria ao Estado. Niilistas, positivistas, socialistas e tutti quanti somente cultivaram o solo da religião estatal. Criou-se assim o palco perfeito para a encenação do século do totalitarismo. O início do século XX foi marcado pelo agigantamento do Estado e pela propagação da mentalidade anticristã. Floresceram e frutificaram ideologias políticas de adoração ao estado, como o comunismo, o fascismo, nazismo e, mais recentemente, a aparentemente inofensiva social democracia.
Ilustração da Universidade de Paris no Séc. XIII
O Brasil não foi exceção à regra: a crença no Estado salvador tornou-se quase uma verdade absoluta a partir da ditadura de Getúlio Vargas. A religião estatal domina as mentes da maioria dos brasileiros até hoje. Arrisco afirmar que o típico brasileiro é um politeísta: crê no Estado, no Dinheiro e, nas horas vagas, crê no Deus dos cristãos. Essa realidade fez com que o papel de educar e ensinar, que antes era das famílias e da Igreja, passasse às mãos do Estado. Durante as últimas décadas, a aversão à religião nas escolas fez com que a Igreja não apenas perdesse o protagonismo no ensino, mas que fosse completamente proibida de exercer qualquer papel evangelizador na educação infantil, até mesmo nas escolas particulares de denominação católica. Parece um absurdo, mas os colégios católicos estão cada vez mais curvando-se à idolatria estatal e financeira. Até mesmo as orações antes das aulas foram abolidas para não ofender os alunos que não compartilham da mesma crença.
Alguns podem argumentar que escola é lugar de ensino, de transmissão de conhecimento, não de prática religiosa. Em resposta a essa argumentação, convido o leitor a pensar no motivo que fez com que, há mais ou menos mil anos, as escolas e as universidades florescessem justamente no seio da Igreja, e não entre as instituições leigas. Por que os monges lutaram tanto para preservar o conhecimento acumulado das mãos destruidoras dos bárbaros? A resposta é simples: por amor à verdade. Mas o que é a verdade? Para os cristãos, a verdade é Jesus Cristo. Quando o evangelista diz que Jesus Cristo é Palavra, ou o Logos, que tudo foi criado por meio Dele e sem Ele nada se fez, está afirmando que a ordem que existe no universo, sem a qual não haveria qualquer ciência, é o próprio Jesus Cristo. Portanto a ciência foi expandida na Idade Média, em primeiro lugar, pois era um meio de se aproximar de Deus. Houve sim várias consequências para a vida prática, como o desenvolvimento de novas tecnologias. Porém os ganhos terrenos não eram o interesse maior, mas sim o conhecimento da Verdade. Notem que, para o cristão, a Verdade é a fonte e o fim do saber. Não há sentido algum em separar o conhecimento da fonte do conhecimento, que é Jesus Cristo. Não fosse a busca da verdade transcendente, estaríamos muito provavelmente lutando pela subsistência em meio à barbárie, como vivia boa parte da Europa antes da expansão dos mosteiros beneditinos. Não há na história da humanidade uma única civilização que tenha desenvolvido a ciência com base no materialismo. A busca de uma verdade que transcende a matéria sempre precedeu o desenvolvimento das ciências, desde os Maias na América pré-colombiana até o confucionismo no oriente asiático.
“Ora - podem revidar - essa é a sua crença cristã e, portanto, esse tipo de raciocínio só vale para os cristãos e não deve ser imposto à sociedade!”. Não posso estar mais de acordo com tal objeção: nenhuma forma de conhecimento deve ser imposta à sociedade. Mas o que vivemos hoje é exatamente a imposição de uma ideologia de endeusamento estatal e de satanização da religião. Nossos filhos são educados para odiar o cristianismo, respeitar as outras religiões e ajoelhar-se perante o Estado onisciente, onipotente e infinitamente benevolente.

2. O Diagnóstico e o Tratamento:

        Identificamos um problema: a imposição estatal, por meio de quase toda a rede escolar, da separação entre busca do conhecimento e religião, o que é, por definição de conhecimento, inadmissível e auto-contraditório para um cristão. Mas esse é somente um sintoma causado por uma doença. E qual é essa doença? A confusão entre instrução ou ensino e educação. Por vários motivos que não nos cabe discutir neste momento, o Estado, por meio do sistema escolar, passou a tomar a responsabilidade de educar as crianças e não mais somente oferecer instrução técnica. As famílias, por sua vez, aceitaram passivamente essa intromissão estatal em suas vidas privadas. Sobrou aos pais a simples e cômoda tarefa de criar, de dar sustento aos filhos. Portanto, essa é uma doença que tem somente uma cura possível: os pais voltarem a assumir a responsabilidade de educar os filhos, com ou sem o auxílio de escolas para dar instrução técnica. Não podemos simplesmente permanecer murmurando contra o sistema de ensino, como se fôssemos vítimas indefesas do Estado malvado. As vítimas são nossos filhos! Nós pais, ao contrário, somos culpados pela educação fraca e imoral que nossos filhos recebem. Fomos nós que escolhemos nos abster de sua educação para jogá-los em uma escola e ter a quem culpar depois. Enfim, se nossos filhos têm aversão ao conhecimento, se eles odeiam estudar, se preferem jogar no iPad do que ler livros, a culpa não é da escola, a culpa é nossa! Enquanto não assumirmos para nós o erro e não nos arrependermos do mal que estamos fazendo ao nossos filhos, nada será mudado.


Realização paterna: transmitir ele mesmo conhecimento aos filhos.
Devemos passar mais tempo com nossos filhos, devemos fazer brotar em seus corações o amor pelo conhecimento. É no seio familiar que eles aprenderão a rezar antes e durante o estudo; somos nós que os educaremos na moral e na fé, não o catequista e muito menos o professor; somos nós que faremos despertar neles o amor por uma profissão. O estudo só voltará a ter como fonte e como fim o amor de Deus quando nós pais fizermos a nossa parte. Ao contrário do que a maioria imagina, isso não é impossível de ser feito. É claro que requer um esforço enorme dos pais, o qual pode consistir em: estudar muito, inclusive para dar o exemplo aos filhos; abdicar de momentos pessoais - e egoístas - de lazer para estarmos juntos aos filhos; abdicar daquele cargo que dá mais dinheiro e prestígio, já que o pai precisará chegar mais cedo em casa para estudar com as crianças; muitas vezes a mulher deverá abandonar o emprego para ficar em casa em tempo integral e, com a renda mais baixa, talvez a família terá que deixar de lado as viagens internacionais ou o fim de ano na praia. Enfim, talvez você ache que o preço a pagar seja alto demais, mas o ganho é infinitamente maior, além dos pais não precisarem mais comprar o afeto de seus filhos com uma infinidade de presentes que nunca iriam conseguir suprir suas ausências, o ganho maior é saber que estamos abrindo as portas do Céu aos nossos filhos. Acredito que nada pode fazer um pai cristão mais feliz do que olhar para trás e constatar que trocou todos os seus projetos pessoais para ver seus filhos estudando por amor a Deus, não por amor ao dinheiro e muito menos por imposição estatal. Enfim, pais cristãos felizes são aqueles que educam seus filhos para a santidade.

 "Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me; porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, e quem quiser perder sua vida por amor de mim, achá-la-á. Pois que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua alma? Ou que dará o homem em recompensa da sua alma? Porque o Filho do Homem virá na glória de seu Pai, com os seus anjos; e então dará a cada um segundo as suas obras." (Mt 16, 24-27)

2 comentários:

  1. Olá família?
    O que dizer desse post?Não tenho palavras para descrever o quanto essas palavras nutrem minha alma de conhecimento e verdade.Obrigada!!!

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  2. Oi Lu! Tudo bem? Obrigada querida. Estamos muito preocupados com o futuro de nossos filhos, e como católicos que somos, temos procurado nos ensinamentos da nossa Santa Mãe Igreja a resposta para nossos anseios. O Papa Paulo VI, nos ensina que o Lar é "a primeira escola das virtudes sociais de que as sociedades têm necessidade". A mãe e o pai, portanto, têm não só o dever, mas também o direito de transmitir aos filhos aqueles tantos valores que convergem para uma correta compreensão da dignidade da pessoa humana. Sendo assim, esse direito dos pais é inegociável e não pode de maneira alguma ser usurpado ou vilipendiado. Como bem nos alerta o Padre Paulo Ricardo em seu blog, de toda essa questão, o que se está em jogo não é somente a educação das crianças. Isso é só a ponta do iceberg. O que se está em jogo é a própria organização da sociedade e a fé que a sustenta. A instituição familiar e, por conseguinte, todo o arcabouço que dá forma à reunião de todo o gênero humano, encontra-se ameaçado, na iminência da instauração de uma cultura da morte. Neste sentido, cabe a nós pais assumir de vez a educação de nossos pequenos e não permitir que eles façam parte disso, como nos ensinou nosso Senhor, devemos viver no mundo sem sermos do mundo. Fique com Deus querida. Um grande abraço.

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