sexta-feira, 20 de novembro de 2015

E a socialização?



A família é a primeira e fundamental escola de socialização: enquanto comunidade de amor, ela encontra no dom de si a lei que a guia e a faz crescer. O dom de si, que inspira o amor mútuo dos cônjuges, deve pôr-se como modelo e norma daquele que deve ser atuado nas relações entre irmãos e irmãs e entre as diversas gerações que convivem na família. E a comunhão e a participação quotidianamente vividas na casa, nos momentos de alegria e de dificuldade, representam a mais concreta e eficaz pedagogia para a inserção ativa, responsável e fecunda dos filhos no mais amplo horizonte da sociedade.

São João Paulo II, Familiaris Consortio, 37.

Todas as vezes que falamos sobre Homeschooling com nossos familiares e colegas, surge a seguinte indagação: “Concordo que educar os filhos em casa pode ser mais eficiente e mais compatível com os valores morais cristãos, mas e a socialização? As crianças precisam de amigos! Elas não ficarão isoladas em casa, sem contato com pessoas?”

Para responder a essa pergunta, devemos antes precisar o que significa sociabilidade e socialização para não correr o risco de falar sobre uma coisa e querer dizer outra.




1. Definição

a.       Sociabilidade

Diferente da socialização, a sociabilidade é uma habilidade ou um conjunto de habilidades de uma pessoa em se relacionar com outros.  Por exemplo, se uma pessoa é extrovertida e simpática, ela tende a ser mais sociável do que uma pessoa introvertida e mal humorada. Portanto, a sociabilidade é uma ferramenta para a socialização.

b.      Socialização

Segundo o Dicionário Caldas Aulete, a socialização é o “ajustamento de uma pessoa, especialmente uma criança, ao grupo social em que se deve inserir (processo de socialização)”. Portanto, socializar é adequar-se à vida em grupo, o que não é em si algo bom ou ruim, a depender do grupo no qual a pessoa se socializa. Quando uma criança vai à escola e adequa-se às regras de convivência de seus colegas, podemos afirmar que ela está socializada naquele meio. Caso a criança fique isolada dos colegas, dizemos que ela não se socializa, muitas vezes por falta de sociabilidade, como acontece com crianças muito tímidas. Apesar de ser um tanto óbvia, essa definição nos faz formular outra questão de resposta não tão simples: em que meio eu quero que meu filho seja socializado? Como educá-lo de modo a fornecer a ele habilidades sociais para que possa se adequar a um meio social saudável, que o leve a ser uma pessoa melhor?


2. Socialização e sociabilidade no lar e na escola

No fim das contas, o objetivo de todo pai cristão é educar seu filho para amar. Se uma pessoa ama as pessoas com quem ela convive, ela certamente não sofre de nenhum problema de socialização. Portanto, devemos ensinar nossos filhos a servir o próximo, a sacrificar-se por outra pessoa, a esforçar-se para fazer o bem, a respeitar as pessoas diferentes etc. Esse deve ser o núcleo da preocupação dos pais em relação à socialização de seus filhos. Abaixo dessa dimensão caritativa, podemos citar também outros elementos, desta vez relacionados aos sentimentos da criança, como a diversão em grupo, as brincadeiras, esportes etc. Queremos que nossos filhos sejam santos e que se divirtam, que brinquem, que sejam crianças. Refletiremos agora sobre como o ambiente familiar e escolar podem influenciar a socialização das crianças.


a.       Aprendendo a amar

Não há forma melhor de socialização do que amando e não há lugar melhor para aprender a amar do que em casa. Lembremos que o lar deve ser uma Igreja doméstica. Devemos amar a Deus sobre todas as coisas, estar sempre em oração e frequentar os sacramentos. Se cultivamos o amor divino, ele será refletido no matrimônio e chegará aos filhos. As crianças aprendem a amar ao serem amadas pelos pais e ao vivenciar o amor entre eles. Se os pais se doam, se perdoam, se sacrificam um pelo outro, as crianças aprenderão a agir da mesma forma. Quando um filho vivencia o fato dos pais deixarem de fazer o que lhes dá prazer para ensiná-los, eles aprendem que estão sendo amados. Além da influência do exemplo, pais que estão mais próximos dos filhos podem ensiná-los e incentivá-los a práticas de amor. Por exemplo, uma mãe que educa os filhos em casa sabe muito bem se um irmão está sendo egoísta com o outro irmão, podendo então corrigir essa característica. Se a criança passa o dia na escola e com a empregada, os pais raramente saberão se os filhos estão realmente cultivando os valores sociais cristãos. O menino pode ser um egoísta, agressivo, mentiroso e tantas outras coisas e os pais só descobrirão isso quando tais vícios já estiverem enraizados em seus corações. Pelo mesmo motivo, praticamente todas as habilidades sociais são melhor praticadas em um lar onde há educação domiciliar do que na escola. Como pais que convivem 2 ou 3 horas por dia com os filhos saberão se eles são, por exemplo, excessivamente introvertidos ou se estão por algum motivo se excluindo do convívio com os amigos?



b.      Autoconfiança versus Aceitação dos pares

Uma das habilidades sociais mais importantes que uma pessoa deve possuir é a autoconfiança. Um sujeito inseguro certamente tem problemas de convívio, pois tem medo de expressar sua opinião ou agir perante outras pessoas. No lar, quando uma criança faz algo de bom, os pais elogiam e as incentivam a repetir e a avançar em tais ações. Quando a criança faz algo de errado ou fala algo que não deve, os pais caridosamente as ensinam como é a forma correta. Elas aprendem que o erro faz parte do aprendizado e são ensinadas a ser humildes, a reconhecer que precisam sempre aprender mais. Isso gera autoconfiança nos filhos de modo que, quando vivenciarem uma discussão ou tiverem que fazer algo em público, não temerão os erros e nem as críticas.

Na escola costuma acontecer o contrário, pois as crianças sentem a necessidade de aceitação do grupo. Elas precisam fazer o que for preciso para serem aceitas e admiradas perante seus pares. Começam assim a falar como todos falam, agir como todos agem e quem faz diferente é zombado e excluído do grupo. Por esse motivo, tantas vezes vemos adolescentes agindo de modo contrário às suas convicções somente para não destoar dos colegas. Não bastasse o mal que isso faz à autoconfiança da criança, tal comportamento pode levar nossos filhos a criar hábitos e convicções contrários à fé. Por exemplo, as meninas sentirão necessidade de vestir as roupas que as outras meninas usam, por mais promíscuas que sejam. Os meninos que defendem a castidade serão perseguidos até o último dia da escola. Poderíamos citar uma infinidade de exemplos! É lógico que adolescentes que mantém suas convicções e seus valores mesmo depois de passar por vários anos de provação na escola serão pessoas fortes e firmes na fé, mas eles são minoria. O próprio vício da pornografia que aflige tantos jovens dentro da Igreja é uma prova disso.

Fica então a pergunta: vale a pena a socialização dessa forma? Queremos que nossos filhos se adequem a grupos de pessoas que agem completamente em desacordo do que ensinamos a eles? No fim das contas, o grande desafio dos pais cristãos é evitar que o filho seja socializado na escola!

Que socialização queremos para nossos filhos?


c.       Convivência com os diferentes

Muitas pessoas acreditam que a escola é o melhor ambiente para as crianças aprenderem a conviver com as diferenças. Mas de que diferença nós estamos falando? Quando as crianças estão na escola, elas costumam formar grupos de amigos de sua idade e com gostos e comportamentos semelhantes. É normal a exclusão e discriminação de crianças que não se adaptam a esses grupos. Não é à toa que há uma crescente preocupação com bullying no meio educacional. De fato, ainda que frequentem o mesmo ambiente, os estudantes vivem em grupos de semelhantes, não de diferentes.

Em uma família que pratica o Homeschooling, os pais têm mais tempo para ensinar aos filhos a amar as pessoas diferentes. Se ensinamos nossos filhos a amar o próximo, certamente eles crescerão sem preconceitos. Os pais podem levar os filhos a asilos, casas de acolhimento de mendigos e tantos outros lugares para as crianças aprenderem que há pessoas que sofrem muito. Isso os ajudará a criar uma postura de gratidão perante Deus e uma maior disposição a colocar-se a serviço dos outros. Eles também convivem com irmãos de idades diferentes. A convivência com os irmãos em tempo integral faz com que se estabeleça um laço de amizade mais forte entre eles, mesmo havendo vários anos de diferença entre uns e outros. Por exemplo, um garoto que ensina algo a seu irmão mais novo está amando. O que une os irmãos aqui não é mais um jogo de gostos e interesses, como entre colegas de escola, mas é um laço de amor concretamente vivido entre eles.

A maior convivência com os pais também é uma grande ajuda às crianças para que elas aprendam a lidar com as diferenças. Elas testemunham diariamente o que é o mundo adulto, quais são as preocupações e até mesmo as diversões de um adulto. Isso evita que os filhos vivam em um mundo artificial onde a maioria das pessoas tem a mesma idade e os mesmos interesses.


d.      Divertindo-se e fazendo amizades

É comum que as pessoas imaginem que crianças que fazem Homeschooling não possuem amigos ou que vivam isoladas e entediadas em casa. Essa tese não se sustenta por vários motivos: as crianças que são educadas no lar tendem a ser mais amigas dos irmãos; elas possuem vários amigos na Igreja; fazem amizade com colegas do esporte e com os vizinhos.  A diferença é que na escola os pais não têm controle nenhum sobre as amizades dos filhos. Eles passam o dia convivendo com pessoas que não sabemos quem são. Por isso não é de se espantar quando, de repente, os pais descobrem que os filhos tornaram-se pessoas muito diferentes do que desejavam. Por mais que nós ensinemos o que é certo e errado, os jovens precisam sentir-se inseridos e adaptados em seus grupos de amigos. Não estamos defendendo que nossos filhos devam ser isolados e protegidos como taças de cristais, até porque nós cristãos somos chamados a ser luz para este mundo. O que estamos dizendo é que não devemos ser ingênuos ao ponto de achar que nossos filhos são santos mártires que estão prontos a ser enviados a Sodoma e Gomorra e que sairão puros de lá. Nós afirmamos isso com base no que estamos vivenciando com o Victor Hugo. É uma luta diária não permitir que ele se torne como um dos meninos de sua escola. Desde vestimentas, jeito de falar e até comportamentos morais e gostos artísticos, a criança é influenciada pelas amizades em todos os aspectos de sua vida, por mais que os pais se esforcem. Os colegas de escola do Victor Hugo ouvem funk quebradeira na hora do intervalo, compartilham pornografia no celular e se embriagam em festinhas. Estamos falando de meninos de 12 anos de idade de uma das escolas particulares mais bem conceituadas de Brasília! Se eu coloco meu filho para passar 200 dias por ano junto a essas pessoas, como posso desejar que ele não se torne um deles?

Nós desejamos que nossos filhos tenham bons amigos e que se divirtam. Queremos que eles pratiquem esportes, leiam livros, joguem jogos de tabuleiro, conversem sobre suas descobertas etc. Para que tudo isso ocorra de forma saudável, não há ambiente melhor que o lar onde se pratica educação domiciliar.         

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